O “habitus” de Elias
Para
Norbert Elias o “habitus” configura-se como a apreensão de valores de um grupo
social por parte de um indivíduo que vive neste grupo. O “habitus” perdura no
tempo histórico conforme seu poder de arraigamento num grupo. O comportamento
individual ocorre em consequências de relações pretéritas ou atuais.
Elias
sustenta que mesmo em situações que o indivíduo toma ações por iniciativa
própria, assim o faz porque estas estão já inseridas na coletividade. A
identidade individual só se faz presente numa identidade coletiva.
O
“habitus” pode sofrer modificações pois os indivíduos dentro da coletividade
interagem-se entre si. A possibilidade de aceitação em apreender o pensamento
coletivo por um indivíduo aumenta em demasia quando ele sente-se de alguma
forma coagido, como pela propaganda ou por algum tipo de milícia. Para Elias, o
“habitus” social pode ser algo tão forte que faz com que indivíduos acabem por
aceitá-lo sem pestanejar por serem absolutamente naturais, não obstante, para
Elias, são criados pelos próprios humanos o mais das vezes.
Belém
e Andrade destacam que o “habitus” social foi disseminador da ideologia nazista
na Alemanha dos anos 20 e 30 em virtude do sentimento de humilhação entre os
alemães, fazendo-os unirem-se com um ideário revanchista coletivo. O papel do
Estado foi crucial para lograr êxito à fidelidade de concidadãos à essa
ideologia política, oportunidade em que se utilizou peças publicitárias e a
repressão física para estabelecer ainda mais o medo coletivo.
Mister
observar que a explicação de Elias serve também de explicação para a
transmissão de ideologias religiosas, morais, políticas etc. Por exemplo, um
patrão que busca criar o perigo de demissão para os empregados de sua empresa
se os mesmos aderirem a sindicatos; ou de um professor que se utiliza de várias
estratégias para convencer seus alunos a adotarem sua crença
político-ideológica, utilizando-se de sua autoridade para achacar discentes
que, por algum motivo, fazem-se resistentes a tal ideologia política, inclusive
através de medidas de algum tipo de abuso psicossocial em conluio a demais
alunos a ele condescendente.
De
ascendência judaica foi um dos perseguidos pelo regime nacional-socialista na
Alemanha.
O hábito de “Bourdieu”
Pierre
Bourdieu interessou-se pelo “habitus” ao relacionar o pensamento escolástico e
a arte gótica do historiador de arte alemão Erwin Panofsky. Para Bourdieu, o
“habitus” perfaz-se na cultura (sistema de esquemas consciente e inconsciente
internalizados aplicados a situações particulares). Ele buscou compreender o
comportamento dos agentes e os condicionamentos coletivos de existência.
Bourdieu
leciona que o mundo social é objeto de uma relação oriunda da experiência
familiar (fenomenológica), uma ruptura ulterior a esse conhecimento primário e
familiar, constituindo-se em práticas econômicas e linguísticas (objetivista),
e o terceiro (praxiológico), constituído pelo objetivista com as capacidades de
exteriorizar a interioridade e interiorizar a exterioridade.
As
ações cotidianas do agir são impostas por disposições estruturadas socialmente
e estruturantes nas mentes dos indivíduos, perfazendo-se na relação dum
“habitus” e as pressões existentes numa conjectura, existentes num determinado
momento histórico.
A
memória que habita no “habitus” é de característica volúvel e sempre aberto
para experiências inovadoras, consoante Bourdieu. Graças a essa capacidade
contínua de transformação que ocorre a adaptabilidade às diversas situações práticas.
Os
“habitus” dos indivíduos são interdependentes para a feitura de momentos
pretéritos, a trajetória atual e o devir ulterior, existentes ao acaso e,
muitas vezes, incoerentes, constituindo-se de esquemas mistos acionados diante
de uma realidade exigida.
Comparação
Basicamente
Elias e Bourdieu debruçam-se sobre o mesmo objeto, “habitus”, mas cada um de
sua maneira. Ambos dão importância a episódios dispostos no decorrer do tempo.
Bourdieu
relaciona o “habitus” ao futuro, diferente de Elias. O primeiro também cria
sobre os modos de conhecimento teórico (fenomenológico, objetivista,
praxiológico). Parece-nos que o pensamento de Bourdieu é mais complexo.
Referências
BELÉM,
Letícia Christina Costa; ANDRADE, Mariana Dionisio. Norbert Elias e a sociedade
dos indivíduos: o habitus que disseminou o nazismo. In: ENCONTRO DE
INICIAÇÃO CIENTÍFICA DA UNI7, 7. Anais..., 2018. Disponível em: https://periodicos.uni7.edu.br/index.php/iniciacao-cientifica/article/view/615. Acesso em: 24 nov.
2020.
SELTON,
Maria da Graça Jacintho. A teoria do habitus em Pierre Bourdieu: uma
leitura contemporânea. Revista Brasileira de Educação, n. 20, Rio de
Janeiro, mai./ago. 2002. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-24782002000200005.
Acesso em: 24 nov. 2020.
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